Papo Cabeça: Bertrand Cocallemen

Bertrand Cocallemen, mais conhecido como “Coca” (pronuncia-se Cocá) é Diretor de Planejamento da F Nazca S&S para uma das marcas de maior sucesso no Brasil, a Skol, e também para o AfroReggae, a mais importante holding social do país. Nascido em Madagascar, ele cresceu, entre idas e vindas, na França e no Brasil.
Apaixonado por tecnologia, futebol e paraquedismo, esse planner mais do que eclético conta aos leitores do CHMKT sobre a reinvenção em sua carreira que o levou até o planejamento e comenta sobre o seu trabalho à frente de um dos cases de comunicação mais bem sucedidos do mundo.
1 - Conte um pouco sobre a sua carreira.
Sou formado em publicidade, mas trabalhei com tecnologia por muitos anos. Comecei como estagiário na Microsoft França, na área de Marketing em 1998, ano no qual me dei conta da importância que a internet iria tomar nos negócios e na comunicação. Em 1999, quando terminei a faculdade, conversei com o consultor Nuham Szprinc e ele me indicou para estagiar na MLab, que depois virou Neoris.
Na época, era uma empresa que desenvolvia projetos web para grandes contas brasileiras. Concorríamos com a Agência Click e Tesla. Foi uma escola pra mim. Os projetos web evoluíram rapidamente de um pequeno conjunto de páginas html para projetos que envolviam integração com sistema legado. Em paralelo a isso, a profissão de atendimento rapidamente mudou para gerenciamento de projeto. Isso tudo me levou a trabalhar como consultor no Banco Real e mais algumas empresas. Mas no final de 2004, resolvi que queria mudar o rumo da minha carreira.
Após um tempo de reflexão, resolvi que eu queria trabalhar com publicidade. Foi uma busca interna que me levou a esse mundo considerado totalmente superficial! Mas não me arrependi. Em poucas semanas, consegui uma entrevista na F/Nazca Saatchi & Saatchi para uma vaga de gerente de projeto de internet. Os skills requeridos para a função eram os mesmos que eu já havia aprendido até então, mas o foco do projeto era publicidade. E isso mudou tudo para mim.
Tive a sorte de trabalhar por 2 anos e meio no coração da agência, ao lado de um dos gênios da publicidade brasileira e de vários profissionais extremamente competentes. A Meca da publicidade. Além disso, tem vista pro parque do Ibirapuera.
Minha ansiedade relativa à carreira me alcançou novamente. Eu não queria continuar gerenciando projetos. Foi aí que recebi o convite do Fernand Alphen para integrar a equipe de planejamento.
2 - Quais foram seus maiores desafios na transição para o planejamento? Como sua experiência em tecnologia ajudou nesse processo?
O desafio foi grande. Planejamento de Skol, a então terceira maior marca de cerveja do mundo, maior market share do Brasil, e uma das contas mais importantes da agência. O volume de assuntos da marca é assustador e ao mesmo tempo é o que nos motiva.
Fui conquistando a confiança do cliente assim como sinergia com atendimento, premissas essenciais para fazer um bom trabalho no planejamento de qualquer conta. Mas minha maior dificuldade foi mesmo entender exatamente o papel do planejamento no processo como um todo. Meu background em tecnologia ajudou muito. A internet está se tornando um meio cada vez mais importante na comunicação de todas as marcas.
3 - O que você faz no dia-a-dia da agência?
Eu diria que não tem dia a dia. Não tem monotonia. Quando dá tempo, uma das coisas que mais faço é navegar na internet e ler artigos, pra ficar antenado. Mas é muita correria. Briefings, acompanhar pesquisas, reuniões, milhares de reuniões, e um exercício constante de reorganização de prioridades. Acho que é uma arte saber equilibrar os pratos entre o urgente e o importante.
4 - A Skol conseguiu uma identificação muito grande com o seu público e é, hoje, um dos maiores cases do mundo. Na sua opinião, o que fez da marca uma das mais queridas pelos brasileiros?
Com certeza a Skol é uma das maiores lovemarks do Brasil. A história de comunicação da marca desde o final de 1997, quando a conta veio para a F/Nazca S&S, é sinônimo de sucesso e conquistas. O slogan "A cerveja que desce redondo" - uma brilhante sacada para dar um novo significado ao que é uma cerveja que tem um perfeito equilibro entre sabor, leveza e suavidade - foi uma das pedras fundamentais dessa história bem sucedida. Mas não dá pra parar por aqui não. Tem muito trabalho. Muitas campanhas pela frente. A Skol soube se reinventar o tempo todo, inovando e sempre surpreendendo os consumidores.
5 – Quais os trabalhos dos quais você mais se orgulha?
Primeiro foi ter participado desde o início do posicionamento atual que Skol utiliza na comunicação: Redondo é rir da vida. Conquistar o prêmio na ABEMD (associação brasileira de marketing direto) com o case Skol Litrão, que foi um prêmio inédito para AmBev e para a F/Nazca. E, mais importante do que isso, foi um case no qual a estratégia foi 100% elaborada na agência. Eu também me orgulho bastante de ter coordenado a conta da Nike Futebol, ainda como gerente de projeto online, durante os primeiros meses na agência. Foi uma aventura muito interessante, na qual criação de conteúdo era mais importante do que a compra de mídia. Um outro trabalho que está me deixando cada vez mais orgulhoso é o do Blog do Birner (http://blogdobirner.net). Desde 2007, assessoro o Vitor Birner com estratégia digital e agora marketing em geral. Até me arrisco a escrever uns posts de vez em quando.
6 – Como foi o trabalho do Skol Litrão? A agência chegou a desenvolver o formato do produto?
Você diz, o formato da embalagem? Não. Trabalhamos com comunicação, envolvendo todas as mídias: TV, rádio, mídia impressa, mídia exterior, internet, material de ponto de venda e neste caso, marketing direto.
7 - Recebo diversos e-mails de profissionais de outras áreas - dentro e fora da propaganda - que sonham em trabalhar com planejamento e pedem dicas. O que você recomenda àqueles que desejam fazer essa transição?
Não sei se eu vou dar um bom conselho, mas creio que para captar a atenção de um interlocutor que possa ajudar nisso, tem que saber despertar interesse apresentando suas credenciais, e ao mesmo tempo ter humildade o suficiente para não criar uma situação de monólogo. Tem que despertar a simpatia do seu interlocutor. Difícil né?
8 - No livro A Arte do Planejamento, o Jon Steel conta que o fato de ser um inglês trabalhando nos Estados Unidos rendeu grandes insights para os seus clientes, pois conseguia enxergar pontos na cultura e no dia a dia dos norte-americanos que a maioria dos concorrentes não conseguia ver. Como o fato de vir de uma cultura diferente influencia no seu trabalho de planner?
Influencia muito. Além de naturalmente ter outras referências, a formação “à la française” exige muita capacidade analítica. Isso ajuda a estruturar o pensamento. Além disso, escrevemos muito, em todas as matérias. Talvez um bom conselho para alguém que aspira trabalhar com planejamento seja viver ou trabalhar em outra cultura. Creio que isso seja a melhor forma de testar sua capacidade de adaptação, uma qualidade essencial desta função ao meu ver.
9 – Finalizando, o que é, para você, o planejamento?
Primeiro, não sou nenhum guru. Ainda tenho muito estrada pela frente. Tendo a não gostar muito dessas perguntas que exigem uma resposta iluminadora. Mas vamos lá.
Planejamento é uma função na qual rapidamente você pode ser estigmatizado como o carinha inteligente que sempre precisa ter algo interessante para falar. Se for isso, sai dessa.
Meu jeito de ser planejamento é ser insaciável, inquieto e chato, uma característica que me obriga a não negar minha origem francesa. Não me contento com o bom, aprendo mais com críticas do que elogios, sempre dá para melhorar. Tem que ser curioso, conversar com pessoas de muitas áreas, que nada tem a ver com publicidade. Aliás, já estou extrapolando. É algo que tem muito mais a ver com um jeito de viver do que trabalhar.
Fonte: http://www.chmkt.com.br/